Eufrásia Teixeira Leite: Autonomia pessoal
Eufrásia Teixeira Leite com cerca de 17 anos de idade, pastel sobre tela, autor desconhecido. Segunda metade do século XIX. Fonte: IBRAM, Museu Casa da Hera, 2015.
Uma jovem de 22 anos, solteira e gerindo um patrimônio milionário, nos causa admiração em 2021, imagine isso em 1872. Eufrásia Teixeira Leite (1850-1930) foi uma exceção aos padrões do século XIX que impunham regras às mulheres solteiras, nas quais autonomia financeira não fazia parte. As irmãs Eufrásia e Francisca perderam os pais e herdaram uma grande fortuna. Pressionadas pelos tios a fazerem casamentos indesejados, mudaram-se para Paris. Eufrásia participou ativamente da alta sociedade parisiense e demonstrou excelência como financista, tornando-se uma das primeiras mulheres a investir na bolsa de valores. Teve um relacionamento de 14 anos com o político Joaquim Nabuco (1849 – 1910), todavia o casamento não se concretizou devido às diferenças de interesses.
O único quadro que retrata Eufrásia quando jovem é um registro importante. Seus olhos são acentuados por sobrancelhas arcadas e seus cabelos estão tão presos para trás que aparentam serem curtos. Usa um vestido de baile preto acinturado com amplo decote com alças e os braços desnudos. Gilda de Mello e Souza ao analisar o jogo da vestimenta feminina no século XIX afirma que “o vestido da mocinha era, é verdade, paradoxalmente mais modesto que o da senhora casada” (2009, p.152). As jovens sem marido deveriam demonstrar recato e mistério. Eufrásia nos parece desafiar o código, utiliza sua postura e descobre parte do seu corpo. Não se sabe a procedência do vestido em que foi retratada, como deve ser de 1867, estaria em sintonia com a silhueta da moda francesa do período. Esse poderia ter sido adquirido na Rua do Ouvidor, ou mesmo no ateliê da Madame Masson, instalado em Vassouras, em 1864.
Durante os 50 anos que viveu na França, Eufrásia conservou a residência da família em Vassouras, a Casa da Hera. Entre os objetos e decoração oitocentista preservados, o acervo contém uma coleção de indumentária com 48 peças, em sua maioria da alta-costura francesa num recorte temporal das últimas décadas do século XIX ao início do XX.
Por Flávio Bragança, @flaviobraganca
Para saber mais:
BRAGANÇA, Flávio O. Nunes. O Valor da Réplica: a reprodutibilidade de trajes musealizados com base em projeto de investigação do acervo de indumentária do Museu Casa da Hera. Tese (doutorado). Orientadora: Priscila Faulhaber Barbosa. Programa de Pós-graduação em Museologia e Patrimônio, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO, Rio de Janeiro, 2021.
FALCI, Miridan Britto; MELO, Hildete Pereira de. A sinhazinha emancipada: Eufrásia Teixeira Leite (1850-1930). A paixão e os negócios na vida de uma ousada mulher do século XIX. Rio de Janeiro: Vieira & Lent, 2012.
INSTITUTO BRASILEIRO DE MUSEUS/IBRAM. Coleção Museus dos Ibram. Museu Casa da Hera / Eneida Queiroz, Daniele de Sá Alves, Cinthia Rocha. Brasília, DF: Ibram, 2015. 110p.
MELLO E SOUZA, Gilda de. O espírito das roupas: a moda no século XIX. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
UMBELINO, Ana Carolina de Freitas. O acervo de indumentária do Museu Casa da Hera: proposta de catálogo. Dissertação (mestrado). Orientadora: Luciana Quillet Heymann. Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas, Programa de Pós-Graduação em História, Política e Bens Culturais, Rio de Janeiro, 2016.
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